Gencitabina intravesical.
Gencitabina intravesical é instilada dentro da bexiga após a ressecção endoscópica de tumor de baixo grau. A indicação diminui o reaparecimento do tumor.
Gencitabina intravesical
Gencitabina intravesical é instilada na bexiga após a ressecção endoscópica de tumor de baixo grau. A Gencitabina é um quimioterápico que tem a função de matar as células do câncer que ainda estejam presentes. Além disso, pode reduzir o implante das células neoplásicas que estão em dispersão na urina durante a cirurgia. Entenda por que usar um tratamento local logo depois da RTU de bexiga.
A quimioterapia intravesical tem o objetivo de diminuir a recidiva da doença, ou seja, que o tumor não volte após a sua remoção. Há muito tempo, os cirurgiões tentam eleger uma droga para impedir que o tumor retorne após a sua remoção. Os tumores não-músculo invasivos representam 75-80% dos casos iniciais de tumor de bexiga. São vistos como pólipos, que podem ser únicos ou múltiplos, sendo que estes com frequência recidivam mais. Portanto, após sua ressecção, eles tendem a voltar (recidiva do tumor). Assim, com seu crescimento voltam a ter hematúria. Geralmente, o sangramento urinário aparece como sangue misturado na urina ou só sangue. Por isso, a cor da urina pode variar de rosa até vermelho vivo. As vezes, pode ocorrer coágulos. Portanto, toda mudança da coloração da urina deve ser investigada, pois pode haver tumor no trato urinário.
Quais são os pacientes com maior risco para recidiva da doença após a cirurgia?
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- Pacientes do estádio pT1 (neste caso o tumor invadiu a membrana basal do epitélio da bexiga e a lâmina própria, mas que não atingiu o músculo próprio da bexiga – o detrusor)
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- Tumor maior que 3 cm com base de implantação na bexiga mais alargada
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- Recidiva precoce após a ressecção endoscópica do tumor. É pior o caso que recidiva nos 3 primeiros meses
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- Tumores múltiplos. O pior caso é quando ocorre mais de 8 pólipos
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- Tumor com grau histológico de alto
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- Tumor que apresenta invasão em vasos sanguíneos e linfáticos
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- Presença de carcinoma in situ no urotélio associado ao pólipo de bexiga
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- Persistência de citologia oncótica positiva após a ressecção do tumor. Portanto, quando o patologista identifica a presença de células neoplásica na urina, significa que ainda existe câncer dentro do trato urinário. Pode ser que esteja na bexiga, na próstata ou trato urinário superior. Assim, a sensibilidade da citologia para detectar câncer de risco intermediário e de alto risco se aproximar de 80%. Contudo, seu nível é baixo na detecção de câncer de bexiga de baixo risco, aproximadamente 20%.
Estratificação de risco para câncer de bexiga de baixo risco, baseado na American Urology Association, 2019
Baixo risco | Risco intermediário | Alto risco |
Tumor menor que 3cm de baixo grau, pTa | Recidiva dentro de 1 ano, pTa de baixo grau |
pT1 de alto grau |
Neoplasia urotelial papilífera de baixo potencial de malignidade | Tumor pTa solitário de alto grau maior que 3 cm | Qualquer recidiva, pTa de baixo grau |
pTa de baixo grau multifocal | pTa maior que 3cm (ou multifocal) | |
pT1 de baixo grau | Qualquer carcinoma in situ | |
Qualquer falha de BCG com tumor de alto grau | ||
Qualquer variante histológica | ||
Qualquer invasão angiolinfática | ||
Qualquer tumor de alto grau com invasão da uretra prostática |
Prognóstico da doença
O prognóstico de sobrevida para pacientes com câncer de bexiga não-músculo invasivo é relativamente favorável, com a sobrevivência câncer específica, mesmo se de alto grau. Assim, a sobrevida é de aproximadamente 70-85% em 10 anos e uma taxa maior para doença de baixo grau. Contudo, sua recidiva pode ocorrer por mais de 10 anos.
O câncer de bexiga não-músculo invasivo é clinicamente heterogêneo com ampla probabilidades de recorrência e progressão. Por isso, a razão principal é que sua evolução depende de vários fatores clínicos e anatomopatológicos. O acompanhamento a longo prazo de lesões de baixo grau pTa tem recorrência de 55%, mas progressão de 6%. Quando se fala em progressão, significa que o tumor recidivou com invasão no músculo detrusor ou apresentou metástase. Em contraste, as lesões de alto grau do estádio pT1 apresentam risco de recorrência em torno de 45%. Todavia, há maior progressão, em torno de 20-50%. Portanto, os tumores de bexiga tem grande chance para evoluirem com recidiva no seu seguimento.
Conduta na progressão da doença
O câncer de bexiga não-músculo invasivo é uma doença recidivante. Todavia, conforme a agressividade do tumor, eles podem apresentar progressão local. Assim, nestes casos, está indicada a cistectomia radical, ou seja a remoção da bexiga com uma derivação da urina. Desta maneira, pode-se realizar uma derivação incontinente, cirurgia de Bricker ou se pode fazer, em alguns casos bem selecionados, confeccionar uma nova bexiga, neo-bexiga ortotópica. Na primeira derivação, o paciente usa um coletor na pele para urina, urostomia. Na segunda, a nova bexiga é conectada na uretra. Contudo, nunca será como a bexiga intacta, mas pode ter ótima aceitação funcional.
Gencitabina intravesical
O tratamento com um quimioterápico após a ressecção endoscópica do tumor deve ser feita nas primeiras 24 h após o termino da cirurgia. Contudo, o ideal é que seja feita nas primeiras 6 h. Quando se realiza a cirurgia, o aspecto endoscópico do tumor parece um pólipo, um tumor pediculado. Quando a sua base de implantação na bexiga é fina e o tumor tem grande mobilidade ao fluxo de irrigação, é muito fácil identificá-lo. Sua estrutura é delicada, com vasos que formam galhos onde crescem as células do tumor papilífero. A certeza é grande de que estamos ressecando um tumor de baixo grau histológico.
Além disso, deve-se verificar se o epitélio ao redor do tumor e a distância apresenta mudança no seu aspecto. Neste caso, quando parece um veludo avermelhado e elevado, pode-se tratar de carcinoma in situ – CIS. Deve-se biopsiar estas áreas. Este tumor, apesar de não ser um pólipo, tem estrutura molecular muito agressiva, portanto, um tumor de alto grau. Existem múltiplas mutações em seu DNA. O CIS no seguimento se torna carcinoma invasivo de bexiga em mais de 80% dos casos. Seu melhor tratamento é o BCG intravesical.
Quimioterapia intravesical, o que aprendemos
A quimioterapia intravesical, portanto, deve ser feita após o termino da cirurgia. Hoje em dia, o quimioterápico mais efetivo é a Gencitabina, avaliado em estudo randomizado. Todavia, muitos quimioterápicos foram testados nos últimos 30 anos, mas é considerado o mais efetivo. Ela superou a Mitomicina C, que por muitos anos foi a droga padrão. Portanto, diante dos tumores de baixo grau é importante o seu uso para diminuir a recidiva. Contudo, estudos mostram que a sua efetividade não é boa nos pacientes que apresentam mais de uma recidiva por ano. Além disso, não é efetivo para pacientes com risco de recidiva maior que 5 pela classificação da EORTC. É possível estimar a recidiva e a progressão da doença conforme dados clínicos e anatomopatológicos. Todavia, os quimioterápicos não podem ser aplicados quando ocorrer perfuração da parede da bexiga durante a ressecção do tumor.
Ação intracelular da Gencitabina
A Gencitabina age na fase S do ciclo celular nas células que estão realizando a síntese do DNA, bloqueando a progressão de células através da fase ligada a G1/S. Portanto, ela age nas células que estão em fase de divisão celular. A Gencitabina quando incorporada ao DNA, é adicionado um nucleotídeo ao crescimento das cadeias de DNA. Após esta adição, há uma inibição completa na síntese subsequente do DNA. Assim sendo, epsilon-DNA polimerase é incapaz de remover a Gencitabina e restaurar o crescimento das cadeias de DNA. Todavia, os quimioterápicos apenas são indicados para serem usados no tumor for de baixo grau, seja do estádio pTa ou pT1, com lesão única ou múltipla.
O estudo randomizado com a Gencitabina intravesical
Ensaio clínico randomizado duplo-cego realizado em 23 centros norte-americanos. Isto quer dizer que havia dois braços, um com Gencitabina intravesical e outro com soro fisiológico, o controle. Pacientes operados tinham suspeita clínica de câncer urotelial de baixo grau não-invasivo de músculo com base na aparência cistoscópica. Além disso, nenhum paciente era portador de tumor de alto grau ou sem mais de 2 episódios de câncer urotelial de baixo grau dentro de 18 meses antes da ressecção endoscópica inicial. Eles foram tratados entre janeiro de 2008 e agosto de 2012. Todos foram acompanhados a cada 3 meses com cistoscopia e citologia por 2 anos e depois semestralmente por 2 anos. Os pacientes foram monitorados quanto à recorrência do tumor, progressão para invasão muscular, sobrevivência e efeitos tóxicos. A data final de acompanhamento foi agosto de 2016.
Intervenções
Os participantes foram aleatoriamente designados para receber instilação de Gencitabina intravesical (2 g em 100 mL de solução salina) (n = 201) ou solução salina (100 mL) (n = 205) por 1 hora imediatamente após ressecção endoscópica do tumor de bexiga.
Resultados
Entre 406 pacientes elegíveis randomizados, a mediana de idade foi de 66 anos e 84,7% eram homens. 383 pacientes completaram o estudo. Na análise de intenção de tratar, 67 de 201 pacientes (estimativa de 4 anos, 35%) no grupo Gencitabina e 91 de 205 pacientes (estimativa de 4 anos, 47%) no grupo salina tiveram recorrência de câncer dentro de 4,0 anos (razão de risco, 0,66; IC 95%, 0,48-0,90; p <0,001). Entre os 215 pacientes com câncer urotelial de baixo grau não-invasivo de músculo que foram submetidos à ressecção endoscópica do tumor de bexiga e instilação de drogas, 34 de 102 pacientes (estimativa de 4 anos, 34%) no grupo Gencitabina e 59 de 113 pacientes (estimativa de 4 anos, 54%) no grupo de solução salina tiveram recidiva do câncer (razão de risco, 0,53; IC de 95%, 0,35-0,81; p =0,001).
Quinze pacientes tiveram tumores que progrediram para invasão muscular (5 no grupo Gencitabina e 10 no grupo salina; p =0,22) e 42 morreram por qualquer causa (17 no grupo Gencitabina e 25 em o grupo salina, p =0,12). Não houve eventos adversos de grau 4 ou 5 e nenhuma diferença significativa nos eventos adversos de grau 3 ou inferior.
Conclusões do estudo: Gencitabina intravesical
Neste ensaio clínico randomizado de 406 pacientes com suspeita de câncer urotelial de baixo grau não invasivo de músculo, a instilação intravesical de Gencitabina, em comparação com solução salina, reduziu significativamente o risco de recorrência ao longo de 4,0 anos de seguimento (taxa de recorrência: com a Gencitabina de 35% e na instilação salina de 47%). Portanto, o tratamento causou uma redução na recidiva, da razão de risco de 0,66.
Finalizando, a Gencitabina intravesical imediatamente após a excisão do tumor reduziu o risco de recorrência em pacientes com suspeita de câncer urotelial de baixo grau não-músculo invasivo.
Finalizando, os pacientes com tumor de baixo risco devem receber a Gencitabina intravesical por que há uma redução de 35% da recidiva da doença no seguimento de 5 anos. Contudo, não diminui a taxa de progressão da doença e o risco de morte pela doença. Como sabemos de longa experiência, todos os tumores não-músculo invasivos tem alta chance de evoluirem com recidiva. Assim, os cirurgiões devem adotar esta conduta, que se mostrou eficaz para diminuir as recidivas do tumor de bexiga após a sua ressecção.
Portanto, o conhecimento da história natural dos tumores não-músculos invasivos é fundamental para indicar a melhor estratégia terapêutica, possibilitando o seguimento correto dos pacientes. A conduta deve ser mudada quando o pacientes apresentar risco de progressão da doença.
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Referência
https://www.nccn.org/patients/guidelines/bladder/38/index.html
https://www.auanet.org/guidelines/bladder-cancer-non-muscle-invasive-guideline
https://www.omnicalculator.com/health/eortc-bladder-cancer#about-bladder-cancer