O PSA e o ciclismo, uma questão ainda em discussão. Pode causar prostatite, HPB e câncer de próstata, é uma pergunta que os pacientes nos fazem? O PSA aumenta com o ciclismo?

O PSA e ciclismo?

O PSA e o ciclismo, uma questão ainda em discussão. Pode causar prostatite, HPB e câncer de próstata, é uma pergunta que os pacientes nos fazem? O PSA aumenta com o ciclismo? O PSA pode ser afetado pela atividade esportiva do ciclismo, mesmo que não seja feita por atletas profissionais? Esta questão vamos resolver baseado em dados científicos retirado de recentes publicações médicas. Será que realizar exercícios com bicicleta pode prejudicar sua próstata?  

PSA e ciclismo

 

O que é o PSA?

O PSA é uma molécula produzida pela glândula prostática, na verdade uma enzima. A função do PSA é a liquefação do sêmen após sua ejaculação. A principal fonte do volume ejaculado provém das vesículas seminais, com 75% do seu volume total. Sua composição é basicamente restrita a eliminação de frutose que vai fornecer energia para a mobilidade dos espermatozóides para sua ascensão através da luz do útero e trompas, onde ocorre a fecundação. Neste momento ocorre o inicio de uma nova vida. A glândula prostática contribui com 20-23% do volume ejaculado e o volume proveniente dos testículos é de apenas 2%.

 

Qual a composição estrutural da próstata?

A próstata é composta por dois elementos estruturais, a porção glandular e a estromal (composta por fibras de colágeno e fibras de musculatura lisa). Contudo, as proporção entre a glândula e estroma é variável entre os homens. Geralmente há mais estroma do que glândula, na razão de 3-5:1. Portanto, existem próstata com mais ou menos glândulas em sua composição. Assim, próstatas com maior conteúdo estromal são firmes e as glândulas mais macias, isto pode ser percebido durante o toque retal. Por outro lado, o câncer de próstata deixa a próstata mais endurecida e no início sente-se um nódulo endurecido.

Esta doença surge em 80-85% na zona periférica da próstata e não na zona periuretral (chamada de zona transicional da próstata), podendo ocorrer em 10-15% dos casos. Nestes, os tumores geralmente têm células neoplásicas mais bem diferenciados e portanto com evolução mais benigna após o tratamento.

 

O que é HPB?

A doença benigna é conhecida como Hiperplasia Benigna da Próstata (HPB) e ocorre com o crescimento de glândulas ao redor da uretra prostática. A uretra passa no centro da zona transicional. O seu crescimento ocorre depois dos 25 anos de idade e alguns homens vão perceber o jato mais enfraquecido depois dos 50-60 anos de idade. Isso ocorre porque o crescimento pode estreitar a uretra prostática. Assim, há início dos sintomas clínicos do HPB.

 

O diagnóstico do HPB

O diagnóstico do HPB é feito analisando os sintomas miccionais do paciente e pelo exame físico da próstata, ou seja pelo toque retal. O exame é chato, mas não doloroso e realizado em menos de um minuto. Contudo, ele fornece vários sinais da situação anatômica da glândula, como seu volume, consistência, mobilidade, presença ou não do nódulo endurecido (suspeita de câncer de próstata).

A proximidade da próstata no períneo é pequena uma vez que ao toque retal pode-se sentir a glândula. Logo que se passa o canal anal, que possui extensão de 3-4cm, se sente a superfície posterior da próstata (chamado de zona periférica). Portanto, na atividade de ciclismo há mobilidade da glândula e este impacto pode causar algum trauma mecânico à glândula prostática. Assim, sendo o PSA pode extravasar pela parede para célula e ser absorvido pelos vasos prostático. Dessa forma, pode-se observar aumento do PSA quando dosado no sangue, mas de forma transitória.

 

A meia vida do PSA e sua normalidade

A meia vida do PSA é de 2,3 dias, ou seja, depois deste tempo ele decai pela metade no sangue, se algo causou seu aumento. Assim, ele chega ao seu valor mais baixo como era antes da agressão a próstata (chamado de nadir do PSA). Algumas vezes o aumento é causado por infecção do trato urinário, traumatismo local da próstata, prostatite, biopsia de próstata, câncer de próstata, e HPB e raramente por infarto prostático durante o crescimento natural da próstata, pois o aumento da vascularização não forneceu a necessária quantidade de oxigênio celular. Com o tratamento adequado, o PSA baixa para seu nível basal. Portanto, o PSA serve para monitorar a resposta ao tratamento instituído. Nesta fase é que se deve considerá-lo alterado ou não. Portanto, nem todo aumento do PSA leva a suspeita de câncer de próstata.

O PSA varia com a idade do paciente, volume da próstata, infecção do trato urinário, prostatite, câncer de próstata, entre outras razões. Normalmente, pacientes mais velhos têm PSA mais alto que os homens jovens, mas pode estar dentro da normalidade para sua idade. Estes valores de normalidade por idade devem ser conhecidos pelo médico que esta avaliando o paciente. Resumindo, a cada década de vida depois dos 40 anos, ele sobe 1 ng/mL, e depois dos 70 anos, 2 ng/mL.

 

O que relatam a literatura sobre PSA e câncer

Este é um assunto que já foi avaliado na urologia e ainda mais estudos estão e devem ser realizados para uma conclusão final. Algumas coisas são certas e incontestáveis, como o ciclismo não provoca câncer de próstata. Esta é uma doença causada por danos (mutações) no DNA para ganhar vantagem de crescimento destas células alteradas em relação as normais.

A sua gênese é complexa e ainda há lacunas do conhecimento que estão sendo investigadas por cientistas em muitos laboratórios dedicados ao estudo do câncer em todo mundo. Alias, seu gênese ocorre muitos anos antes do seu diagnóstico clínico, as vezes 20 a 30 anos anos, quando as primeiras mutações já ocorrem. Muitas mutações devem ocorrer para que a doença clínica seja detectada clinicamente. Portanto, é uma doença genética por afetar os genes localizados no núcleo celular. Quando há câncer, o PSA sobe para uma faixa incompatível com a idade e volume da próstata.

 

PSA e ciclismo

A meta-análise é um estudo científico particular onde por critério de seleção rígidos são estudados vários artigos publicados considerados de boa estruturação metodológica. Ou seja, estes estudos são considerados com alto valor de validade para se obter resposta acerca de um assunto específico em Medicina.

Oito estudos preencheram os critérios de inclusão, compreendendo 912 participantes que se envolveram ou relataram atividade de ciclismo. Seis estudos investigaram a mudança no pré e pós do PSA após a atividade de ciclismo que variou de uma única sessão de ciclismo de 15 minutos a um evento de ciclismo de 4 dias. Após a atividade de ciclismo, dois estudos relataram aumento do PSA inicial (basal) em até 3,3 vezes, o PSA livre aumentou em um estudo em 0,08±0,18 ng/mL e não se alterou em quatro estudos. Um estudo comparou o PSA em ciclistas de elite e/ou profissionais versus não ciclistas e não demonstrou diferença significativa nas medidas de PSA entre os grupos pré e pós-ciclismo.

Os dados de seis estudos foram avaliados por metodologia de meta-análise. Assim, não demonstraram aumento significativo no PSA associado ao ciclismo no pré para pós (mudança média +0,027 ng ml, p =0,74, intervalo de confiança de 95% (CI) -0,17-0,23). Portanto, se chegou a conclusão que o ciclismo pode alterar muito pouco o PSA na atividade de ciclismo.

Acima de tudo, dê uma pausa no pedal de 3-5 dias antes de colher seu PSA para o rastreamento do câncer de próstata e diagnóstico da saúde de sua próstata. Se cuide, isso pode salvar sua vida.

 

Um caso clínico

Certo dia recebi um colega médico com 65 anos preocupado pois seu PSA deu 8 ng/mL. Estava urinando bem e ao exame físico nada foi visto de anormal, exceto um pequeno aumento da próstata, sem nódulos e de consistência compatível com doença benigna (HPB) própria para sua idade. Nada de anormal nos antecedentes familiares para câncer de próstata e nenhuma doença prostática prévia. No final da consulta e depois de muito perguntá-lo dizia que fazia exercícios de bicicleta em sua casa. Achei que esta seria a causa do aumento do PSA. Disse para não realizar mais exercícios por 10 dias e repetir seu PSA. O resultado foi 1,1 ng/mL. Portanto, o exame foi absolutamente normal.

O que deve ter ocorrido? O exercício com o pedal pode ter causado um aumento do PSA provocado pelo trauma perineal. Contudo, ele deve ter tido uma inflamação na próstata e/ou um pequeno infarto prostático que aumentou o PSA e consequente extravasamento para o sangue. O repouso fisico, retornou o PSA ao seu normal, pelo decaimento depois do insulto causado nas células prostáticas. Com isso, ele se livrou da biopsia de próstata para procura do câncer em estádio inicial, não palpado ao toque retal.

 

O que dizem as Sociedades de Urologia

Nenhuma diretriz da sociedade brasileira, americana ou europeia relata algum risco para o desenvolvimento de câncer de próstata e HPB. Não há nenhuma referência para a possibilidade do ciclismo estar relacionado ao aparecimento do câncer de próstata ao longo da vida. Contudo, pacientes que estejam com prostatite devem evitar andar de bike até completar o tratamento sob orientação do urologista.

 

A dor perineal causada pelo ciclismo

A dor perineal é uma alteração que ocorre nos praticantes do ciclismo. Tanto é que existem selins mais macios e anatômicos que tem por objetivo minimizar este sintoma desagradável neste esporte praticado em todo o mundo. Muitos utilizam suas bicicletas para lazer, transporte pessoal e mesmo para ir ao trabalho. A dor afeta o períneo por causar compressão do peso corporal contra o selim. Assim, músculos e ligamentos podem sofrer traumatismo durante a ciclismo. Contudo, geralmente não há trauma mais expressivo e raramente a dor perineal pode impedir de andar de bicicleta no dia seguinte. Como resultado, com o tempo há um aumento da resistência perineal diminuindo o traumatismo perineal impedindo sua cronificação e dor.

Tanto, homens como mulheres podem sentir certo desconforto perineal e na genitália após andar de bicicleta por tempo mais prolongado. Mais ainda, você deve usar uma bike apropriada para seu peso e altura. Selim e roupas apropriadas protetoras do períneo podem minimizar a dor perineal.

 

Preparo físico para andar de bicicleta

O ciclista consegue trabalhar vários grupos musculares em diferentes regiões como: quadríceps, posterior da coxa, panturrilha, glúteos, abdominal e extensores da coluna. Além disso, vale lembrar que até os músculos do ombro, braço e antebraço se fortalecem com o ciclismo. Portanto, recomenda-se realizar um condicionamento físico para realizar qualquer tipo de esporte. Pessoas que não estejam com seus músculos fortalecidos previamente são os que mais sentem dores musculares. O mais importante, faça alongamento muscular específicos para antes e depois do treino. Portanto, realizar musculação e fisioterapia, sob supervisão dirigida por profissionais habilitados, pode ser importante para o fortalecimento destes músculos. Aos poucos estes iniciantes melhoram seus performance físico e diminuem as dores musculares após o ciclismo.

 

Objetivo do ciclismo

A regra é não ultrapassar seus limites físicos, pois aos poucos vai ocorrendo a melhora física. Você não deve sentir dor muscular intensa ou esgotamento físico geral depois de andar de bicicleta. Um cronograma de estágios, com tempo de uso e distância percorrida deve ser compatível com sua condição clínica inicial. Assim, o acompanhamento com cardiologista e médicos do esporte podem orientar sua evolução no esporte. Portanto, um passo de cada vez para atingir seus benefícios.

 

Uso de anabolizantes e suplementação de testosterona

O uso de anabolizantes e suplementação de testosterona por qualquer via de administração é absolutamente contraindicado. Estes medicamentos podem causar danos, as vezes irreparáveis a tua saúde, inclusive ser causa de morte súbito. Seja responsável e sua melhora física e mental devem melhorar com a rotina do esporte.

Todo hormônio, seja ele qual for, deve estar dentro do limite fisiológico para idade e sexo. Quando se eleva acima dos limites do desejável para a idade a testosterona ocorre um risco aumentado para o equilíbrio fisiológico do corpo. Consequentemente, há alteração da dislipidemia (do colesterol e triglicérides), risco de infarto agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral, aumento dos glóbulos sanguíneos, aumento do coração (cardiomegalia), aumento da adiposidade abdominal e diminuição da sensibilidade de insulina (desenvolvimento de diabetes). Portanto, seja inteligente e não corra um risco desnecessário de piorar sua saúde e por vezes, com quadros clínicos irreversíveis.

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Referência

Jiandani A et a. Prostate Cancer Prostatic Disease, 2015 Sep;18(3):208-12. The effect of bicycling on PSA level: a systematic review and meta-analysis. https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/25939515/

https://blog.bikeregistrada.com.br/5-dicas-de-bike-para-iniciantes/

https://uroweb.org/guidelines/prostate-cancer/chapter/epidemiology-and-aetiology