quimioterapia e hipogonadismo

Quimioterapia e hipogonadismo

A quimioterapia para tratar o câncer pode causar hipogonadismo (deficiência de testosterona). Estima-se que ocorra entre 40% e 90% nos pacientes em tratamento de câncer.

A quimioterapia para tratamento do câncer pode causar hipogonadismo masculino (deficiência de testosterona). Estima-se que o hipogonadismo ocorra entre 40% e 90% nos pacientes em tratamento de câncer. Assim sendo, esta taxa é significativamente maior do que na população geral. Com o envelhecimento pode ocorrer queda gradativa da testosterona e começa a ocorrer entre os 30-40 anos de idade. Na população normal, seu aumento é progressivo, sendo observado em mais de 50% em homens com mais de 80 anos. Além disso, muitos remédios de uso corriqueiro também podem favorecer para a queda da testosterona.

Hipogonadismo

Acredita-se que a patogênese (por que ocorre) do hipogonadismo em pacientes com câncer seja multifatorial. A inflamação desempenha um papel importante, assim como, a leptina, os opióides, a grelina. Além disso, a quimioterapia em altas doses por diferentes mecanismos têm sido implicados como causa. Mais ainda, existem diferenças de toxicidade entre os drogas aplicadas na quimioterapia, que são mais tóxicos conforme a extensão do tratamento. O hipogonadismo está associado a piora da qualidade da sobrevida nestes pacientes. Portanto, piora os sintomas relacionados ao bem estar físico e mental. 

História clínica e exame físico

Pouca atenção tem sido dada antes, durante e após o tratamento dos pacientes submetidos ao tratamento do câncer. Assim sendo, cabe ao médico avaliar, tanto na história clínica como ao exame físico inicial, a possibilidade da sua existência. Ao exame físico, testículos pequenos e/ou amolecidos são altamente suspeitos. Quando detectado o seu diagnóstico é possível reparação medicamentosa, e desta maneira, restabelecendo a qualidade de vida durante a quimioterapia. Além disso, pode melhorar o desânimo que naturalmente acontece déficit causado pelo tratamento.

Causas da deficiência de testosterona

Sabe-se que a quimioterapia, por múltiplas razões pode desencadear a queda da testosterona. Postula-se que possa ocorrer desde o estresse psíquico como pelas drogas quimioterápicas e/ou radioterapia. Pode agir, tanto localmente nos testículos, como no eixo hipotálamo-hipofisário. O testículo é comandado por hormônios liberados pela hipófise, ou seja, pelo hormônios: folículo estimulante (FSH) e luteinizante (LH). As drogas usadas na quimioterapia e radioterapia podem atingir diretamente estes órgãos, afetando negativamente a produção de testosterona.

A progressão da doença frequentemente é acompanhada pela queda progressiva de perda de peso e desnutrição. Homens com câncer que perderam menos de 10% do seu peso apresentaram níveis mais altos de testosterona do que aqueles com perda de peso superior a 10%.

Hipogonadismo central ou periférico

O hipogonadismo pode ser primário-periférico (testicular) ou secundário-central (hipotálamo e hipófise). Por definição do hipogonadismo, a testosterona deve estar abaixo de 300 ng/dL. No primário, a falha da produção da testosterona pelos testículos, mas o FSH e LH estão elevados. Isto ocorre pois cérebro percebe que a testosterona está baixa e portanto, há necessidade de aumentar a produção de testosterona pelos testículos. No entanto, no secundário não estão sendo produzidos estes hormônios que estimulam os testículos. Portanto, está ocorrendo uma doença cerebral que está prejudicando o hipotálamo e/ou hipófise.

Outros fatores associados ao hipogonadismo primário nessa população de pacientes incluem citocinas inflamatórias e quimioterápicos. Por outro lado, os fatores responsáveis pelo hipogonadismo secundário/central incluem opióides, glicocorticosteróides (corticóides), baixos níveis de leptina e/ou altas concentrações de grelina.

A inflamação no câncer

Acredita-se que a inflamação desempenhe um papel importante na patogênese do hipogonadismo em pacientes com câncer. O câncer, assim como outras doenças crônicas, é um estado pró-inflamatório com níveis elevados de citocinas inflamatórias. Postulou-se que as citocinas podem ter um efeito direto no eixo hipotalâmico-hipofisário-gonadal.
Além disso, dados em animais sugeriram que as citocinas inflamatórias podem ter um efeito inibitório sobre a esteroidogênese das células de Leydig (células do testículo que produzem a testosterona), afetando o eixo hipotalâmico-hipofisário-gonadal ao nível dos testículos.
Portanto, é provável que a inflamação desempenhe um papel muito importante na patogênese do hipogonadismo em pacientes com câncer. Assim, a baixa testosterona pode, por sua vez, exacerbar ou manter o estado pró-inflamatório formando um círculo vicioso. Além disso, a quimioterapia causa destruição das células neoplásicas, causando sua morte nos tecidos que a conterem. Por sua vez para sua remoção há também aumento da inflamação local e sistêmica.

A leptina e o câncer

A leptina é um hormônio secretado pelos adipócitos em proporção à massa gorda e é responsável pela regulação da homeostase energética (ingestão de alimentos e gasto energético) no nível do hipotálamo. Além disso, é necessário para a secreção normal de LH e FSH e produção de testosterona nas gônadas, fornecendo a ligação entre nutrição e reprodução.

Foi proposto que baixos níveis de leptina, como visto na fome ou na caquexia, funcionam como um sensor de nutrientes. Assim, fornecem um sinal periférico ao cérebro de que o ambiente pode não ser favorável à reprodução devido à indisponibilidade de alimentos, levando a uma diminuição nos hormônios sexuais. Em humanos, a restauração dos níveis normais de leptina normaliza o eixo hipotálamo-hipófise-gonadal e reverte a infertilidade e produção de testosterona.

A substituição da leptina também resultou na normalização da queda dos hormônios reprodutivos induzida pela fome em indivíduos do sexo masculino. Como a leptina é secretada pelos adipócitos, a sua atrofia pode potencialmente causar hipogonadismo, diminuindo os níveis de leptina. Isso poderia explicar a maior prevalência de hipogonadismo em indivíduos com caquexia por câncer. Assim, estes pacientes sofrem perda significativa de massa gorda e níveis mais baixos de leptina do que indivíduos com câncer, mas sem caquexia.

A grelina e o câncer

A grelina está envolvida no controle da ingestão de alimentos e secreção do hormônio de crescimento. Seus níveis aumentam em antecipação de uma refeição e com a perda de peso. Desta maneira, se correlaciona inversamente com os níveis de leptina. Baseado nisso, a grelina está diretamente relacionada com o nível de nutrientes disponível e a reprodução. Estudos em animais mostram que a administração sistémica ou intracerebral da grelina causa respostas inibitórias significativas na secreção de LH e, em menor grau, FSH.

Um estudo com 10 homens saudáveis, a administração de grelina foi associada a níveis plasmáticos médios mais baixos de LH e testosterona do que com placebo. Os pacientes com câncer têm níveis de grelina ativos mais altos do que os saudáveis. Desta maneira, os níveis de grelina se correlacionavam inversamente com a testosterona livre e biodisponível. Portanto, estes estudos sugerem que níveis mais altos de grelina causam efeitos inibitórios sobre o LH. Assim, podem contribuir para o hipogonadismo no cenário de balanço energético negativo, como visto nos pacientes com câncer avançado.

Opióides e o câncer

O uso de opióides em pacientes com câncer é comum para tratar a dor de forte intensidade. Os opióides causam hipogonadismo secundário em pacientes sem câncer com dor. O mecanismo exato pelo qual os opióides causam hipogonadismo não é bem conhecido. A testosterona caiu mais de 50% dentro de poucas horas depois de tomar um opioide. Contudo, estava normalizada dentro de 24-72 h após sua retirada. Estudo com 54 homens tomando opióides orais, incluindo metadona para dor não maligna, a testosterona livre e total estavam baixa em 56% e 74% dos pacientes, respectivamente.

A prevalência de hipogonadismo em indivíduos com câncer masculino é de 74% recebendo opióides por dor crônica. Em outro estudo, 18 de 20 sobreviventes de câncer masculino que receberam doses altas de opióides apresentaram testosterona total mais baixa. Por outro lado, ocorreu queda em 8 de 20 sobreviventes de câncer que não receberam opióides. Portanto, o uso de opióides exerce um papel importante na patogênese do hipogonadismo em pacientes com câncer. Além disso, a quimioterapia também pode agredir diretamente as células produtoras de testosterona nos testículos.

Quimioterapia e o câncer

As drogas usadas na quimioterapia são agentes químicos que interferem nas células com câncer para causar a sua parada de crescimento ou morte, no qual chama-se de apoptose. Existem muitos tipos de drogas usadas no planejamento dos esquemas de quimioterapia. Contudo, tudo depende do grau histológico e da extensão do câncer no organismo. É o que se chama de estadiamento do câncer. Na maioria das vezes, com estes dados, o oncologista realizada a quimioterapia câncer específica. Além disso, existem drogas que são muito mais tóxicas as gônadas (testículo ou ovário) e/ou adenohipófise do que outras. Estas drogas usadas no tratamento quimioterápico são divididas em: de leve, moderada, alta e muito alta toxicidade as gônadas. Além disso, é usada ainda mais, quanto mais avançada é a doença e por maior tempo. Portanto, com maior toxicidade gonadal.

Quimioterapia e hipogonadismo

Hipogonadismo devido a qualquer causa afeta a qualidade de vida dos indivíduos afetados. Assim, há diminuição do apetite, diminuição do nível de energia e fadiga, anemia, insônia, baixa da libido, disfunção sexual, humor deprimido e sarcopenia.
O apetite e peso corporal são afetados em pacientes com câncer hipogonadismo. Assim, estudos mostram que há um correlação direta entre os escores de apetite e a testosterona livre e biodisponível em pacientes com câncer. Skipworth et al mostraram que os pacientes do sexo masculino com câncer hipogonádicos experimentaram maior porcentagem de perda de peso do que pacientes eugonádicos com câncer (16,7% vs. 11,3%). Chlebowski et al relataram 66% prevalência de hipogonadismo em pacientes com câncer metastático. Além disso, mais de 80% dos pacientes estavam com menos de 90% do peso corporal ideal.

Hipogonadismo, quimioterapia e sobrevida pelo câncer

Até hoje, houve apenas um estudo que analisou a sobrevida de pacientes com hipogonadismo com câncer. O resultado de este estudo em um único centro mostrou que a sobrevivência de pacientes do sexo masculino com níveis totais de testosterona menor que 185 ng/dL foi menor que em comparação com pacientes com nível maior que 185 ng/dL (93 vs. 433 dias). Por outro lado, em outro estudo, houve uma tendência para uma sobrevida global menor em pacientes com baixa de testosterona que estavam recebendo terapia anti-andrógeno para câncer de próstata avançado. Se o hipogonadismo contribui para uma diminuição na sobrevivência por um mecanismo não bem caracterizado ou é simplesmente um marcador da gravidade da doença não é conhecida.

Concluindo, a terapia de reposição de testosterona é uma questão desafiadora em sobreviventes de câncer e na população masculina geral. Contudo, ela pode ser usada como uma terapia coadjuvante durante o tratamento do câncer com quimioterapia. Desta maneira, pode melhorar as condições clínicas do paciente antes, durante e depois do tratamento. O desafio portanto, é curar o câncer e manter a qualidade de vida desses pacientes. A vida deve continuar na sua plenitude. Viver saudável sempre deve ser objetivo de qualquer tratamento proposto.

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Referência

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3424192/pdf/13539_2012_Article_65.pdf

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2658535/pdf/6604892a.pdf